Dzongsar Khyentse Rinpoche

DKR durante cerimônia do centenário de Dilgo Khyentse Rinpoche, Nepal.

    
    “Nos sutras mahaianas, Buda aconselhou seus seguidores a não comer carne. Causar diretamente mal a um outro ser é uma não-virtude; além disso, o ato de comer carne não complementa os quatro selos*. Isso porque,quando comemos carne, em algum nível praticamos esse ato para nossa sobrevivência, para nos sustentar. O desejo de sobreviver está ligado a querer ser permanente, viver por mais tempo a custa da vida de um outro ser. Se fosse absolutamente garantido que colocar um animal boca adentro nos daria mais tempo de vida, haveria, de um ponto de vista egoísta, motivo para fazer isso. Mas, não importa quantos corpos mortos enfiemos na boca, vamos morrer um dia desses. Talvez antes do que imaginamos.


    Podemos, também, ingerir carne por razões burguesas – saborear caviar porque é extravagante, comer pênis de tigre para adquirir virilidade.consumir ninho de andorinha fervido para manter a aparência jovem da pele. É impossível encontrar um gesto mais egoísta do que esse: por vaidade, uma vida é eliminada. Invertendo os papéis, nós humanos não suportamos sequer uma picada de pernilongo, quanto mais nos imaginar confinados em gaiolas apinhadas, com o bico cortado e esperando para sermos abatidos junto com nossos parentes e amigos, ou engordados em baias para virarmos hambúrguer de carne humana.

    A atitude de que a nossa vaidade vale mais do que a vida de um outro ser constitui apego ao eu. O apego ao eu é ignorância e, como vimos, a ignorância leva ao sofrimento. No caso da ingestão de carne, também provoca sofrimento para outras seres. Por isso, os sutras mahaianas descrevem a prática de nos colocarmos no lugar dessas criaturas e nos abstermos de comer carne por compaixão. Quando Buda proibiu o consumo de carne, ele quis dizer todos os tipos de carne. Ele não excluiu a carne de vaca por motivos sentimentais, nem a carne de porco porque é suja, tampouco liberou a carne de peixe porque os peixes não tem alma.”

*Os quatro selos são: Tudo o que é composto é impermanente, todas as emoções são sofrimento, todas as coisas são desprovidas de existência intrínseca e a verdade de que a liberação, a iluminação, está além dos conceitos.

Extraído do Livro "O que faz você ser budista?"  Editora Pensamento

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