Precioso Ensinamento do Treino da Mente - I

 Jigme Khyentse Rinpoche


Ensinamentos em Barcelona, 05-10-2004. (Parte 1 de 3)

Por Jigme Khyentse Rinpoche

     
    Primeiro quero agradecer a todos por terem vindo aqui esta noite. A razão pela qual estou aqui é porque faz agora, não me recordo exactamente quantos anos, mas talvez 6 anos ou mais, um de meus mestres, Nyoshul Khen Rinpoche, foi convidado a Dak Sang Kagiu Ling, por parte de Lama Drupchun. Então Nyoshul Khen Rinpoche não pode ir e pediu a meu irmão, Pema Wangyal Rinpoche, que fosse no seu lugar. E meu irmão pediu-me que eu fosse a Dak Sang Kagiu Ling. Depois disso não voltei a ali. Desde então, recebi mensagens, cartas, convites... O Lama Drupchun pediu-me para voltar novamente e aqui estou para vos dizer “olá”e encontrar-me com todos vós. 

    Também vos quero dizer que não vim especificamente para dar ensinamentos. Talvez vos pergunteis então o que estou fazendo aqui sentado nesta coisa tão ornamentada. Isto é uma simples distracção, um entretenimento para vós. Como podeis ver sou bastante largo e os trajes normais não me servem. Estou sentado em cima deles. Todos vós haveis recebido ensinamentos budistas antes? Não vos parecem estranhos estes budistas?

    Fui posto em contacto com o Dharma de Buda durante mais ou menos 40 anos. O primeiro contacto que tive com os Ensinamentos do Dharma foi através de meu pai, Kangyur Rinpoche, que foi o meu primeiro mestre. Depois que meu pai deixou o seu corpo, passei algum tempo com Dilgo Khyentse Rinpoche. Dele recebi muitas iniciações. Também tive a grande sorte de encontrar e receber Ensinamentos de Kyabje Dudjom Rinpoche. Mais tarde, como já disse antes, também tive a sorte de estar na presença de Nyoshul Khen Rinpoche. Também particularmente chegada a mim esteve minha mãe, que foi um dos meus mestres, seu nome era Tchampa Tcheky. Estes foram os meus mestres que já deixaram o seu corpo e que fisicamente não estão aqui, neste mundo. Kyabje Trulshik Rinpoche é um de meus mestres que está contudo vivo e vive no Nepal, e é também mestre, actualmente, de Sua Santidade o Dalai Lama. Assim como meu irmão mais velho, Tulku Pema Wanguyal Rinpoche, também é um dos meus mestres. O meu mestre mais jovem é Dzongzar Khyentse Rinpoche. Pois creio que primeiro o que tendes de saber são os nomes destes mestres, os meus mestres. Estes foram os mestres dos quais recebi Ensinamentos, e também considero Sua Santidade o Dalai Lama como meu mestre. Mas não há nenhum tibetano que não pense assim. Apesar de ter estado com meu pai e com Dilgo Khyentse Rinpoche, também tive a sorte de estar com Kyabje Kalu Rinpoche, ainda que não pudesse estar muito tempo com ele. Isto foi o mais próximo que estive do Dharma de Buda. Mais próximo que isto não me foi possível alcançar.
   
    Diz-se que Buda deu 84.000 Ensinamentos diferentes, para ajudar a dispersar todos os tipos de dificuldades e sofrimentos. Mas eu não posso afirmar que conheço todos estes diferentes Ensinamentos. Primeiro Buda escreveu todos estes diferentes tipos de ensinamentos. Houve mestres que estudaram estes ensinamentos, e que tinham uma grande capacidade para compreendê-los. Assim, estes mestres resumiram estes ensinamentos para que as pessoas os pudessem compreender mais facilmente. Um destes mestres foi Maitreya, que expos os Ensinamentos, depois Asanga, que escreveu “Os cinco tratados de Maitreya”. Nagarjuna também escreveu e ensinou muitos tratados sobre o caminho do meio ou Madiamika. Também Shantarakshita expos o caminho do meio.
     
    Assim, eu não posso afirmar que tenha compreendido estes Ensinamentos, e tão pouco que os possa ensinar. Mas por exemplo num texto como o Bodhisatvashariavatara podemos encontrar o caminho completo para a iluminação. Inclusive mesmo que a minha mente seja vasta (ampla), não posso dizer que conheça tudo isto. Logo, as práticas estão resumidas em “As 37 práticas dos Bodhisatva”, “O Treinamento da Mente em 7 pontos”, “As 8 estrofes para o Treinamento da Mente”, e não posso dizer que eu as sei, não posso afirmá-lo. Mas o que posso compreender é que os Ensinamentos de Buda aconteceram para nos fornecer as ferramentas com as quais possamos lidar com as situações adversas. Assim, basicamente os Ensinamentos de Buda são para treinar a nossa mente.

Agora, para ter uma ideia clara dos benefícios que nos podem dar os Ensinamentos de Buda, é necessário saber se a nossa mente necessita deste treino ou não. 

    Se nós não temos a certeza se a nossa mente necessita deste treino ou não e depois nos comprometemos com a via budista, isto será algo que nos cansará. Por vezes é agradável mas às vezes é bastante incómodo. É como às vezes, quando nos convidam a jantar e pensamos: “que bom que nos tenham convidado”, e às vezes podemos pensar: “oxalá que não nos tivessem convidado”. Isto ocorre quando entramos pela primeira vez no caminho budista. Estou certo de que já se passou com vocês irem com uma pessoa e depois tendes que repetir uma coisa que não entendeis, isto é o que se chama Refugio. No inicio, sentimo-nos bastante bem por termos tomado Refugio. Mas depois disto vêm todas as dificuldades do Refugio. Tendes que recitá-lo todos os dias. Logo sentimo-nos culpados, quando deixamos de fazer as orações durante vários dias. E quando alguém nos aborrece, quando nos irritamos também nos preocupamos, sentimo-nos mal. Estas coisas convertem-se numa rotina bastante incómoda, se não temos a certeza de que a nossa mente necessita deste treino.

    O que é exactamente? Quais são as coisas que nos fazem pensar que a nossa mente necessita deste treino? Por exemplo, no nível físico, quando necessitamos dum treino, vamos ao médico e o médico comunica-nos este facto, diz-nos: “tendes que fazer exercício”. Este é um facto físico porque não temos suficiente musculatura. Realmente, depende do quanto estamos convencidos disso. Esta coisa que chamamos “a nossa mente”. Não sei o que vós pensais quando digo “mente”(digo “mente”, mas também poderia dizer “espírito”. N.T.). Mas, para a comunicação, quero definir o que quero dizer quando uso a palavra “mente” ao falar do Treino da Mente. O que eu chamo mente, aqui, é essa coisa que não nos dá tranquilidade, que não permite que possamos estar tranquilos e descansados. Mas não podemos rejeitar a mente, necessitamos dela porque se não tivéssemos mente então seríamos uma coisa inerte. De qualquer modo, até agora, não tivemos nenhuma maneira de nos libertarmos dela. Não há nenhuma maneira material através da qual nos possamos libertar desta mente e estar conscientes ao mesmo tempo. Talvez possamos tomar comprimidos para isso mas o efeito não durará muito tempo. E é por isso que temos que fazer algo com a mente. É possível treiná-la?  É porque a mente é impermanente, continua mudando a todo o momento. Eu tenho a certeza de que todos vós estais de acordo de que a mente é impermanente, porque senão no momento em que a mente tinha uma emoção, esta emoção seria permanente, ela estaria sempre ali. Agora, por favor, não vos preocupeis e não penseis que tudo isto soa muito intelectual. O importante é compreendermos isto. Para podermos treinar a mente é importante ter confiança em que a mente é impermanente porque assim podemos mudá-la.

    Como todos sabeis, a nossa mente, desde o nascimento até agora, passou por tantas experiências diferentes, experiências que dependiam e dependem das diferentes condições. Fomos simplesmente vítimas das circunstâncias. Ainda que possamos pensar que somos pessoas livres por vivermos em democracia, realmente, quanto somos livres? Podemos pensar que temos a liberdade de pensamento e que a nossa mente é livre. Mas é realmente livre? Se a mente fosse realmente livre porque escolheria o sofrimento? Eu penso que se nós acreditamos que a mente é livre e que todos estamos de acordo em que todo o mundo quer ser feliz, então todo o mundo teria que ser feliz. Mas o facto de que há sofrimento é a prova de que a nossa mente não é livre. Por exemplo, se a nossa mente fosse realmente livre, porque escolheria sofrer com os ciúmes? Porque escolheria sofrer com o aborrecimento? Não podemos negar que sofremos com os ciúmes e o aborrecimento.

    Se aqui há alguém que nunca sofreu de inveja (ciúmes) ou o aborrecimento (cólera, irritação), então gostaríamos de saber como conseguem fazê-lo. Então, isto é a prova de que seja qual for o sofrimento que experimente a mente, ele é impermanente. Por exemplo, se alguém sofre por ciúmes, então vem a emoção do aborrecimento e para esconde-la procura a emoção do prazer, do apego e com esta emoção ainda surgem mais ciúmes. E assim continua mudando. Então, isto é a prova de que podemos fazer algo.

    Até agora estava dizendo que somos vítimas das circunstâncias. Como podemos entender este princípio da impermanencia da mente? Por exemplo, quando alguém está muito apegado a uma pessoa, quando realmente se diz que está louco por outra pessoa, reina esse sentimento de estar enamorado da cabeça aos pés. Primeiro a pessoa tem esse sentimento, depois a outra pessoa não lhe corresponde, então nesse momento este sentimento muda devido às circunstâncias e surge a dor. Sente-se ferido, sente-se ciumento. Então, aqui a ideia do treino da mente é precisamente o que temos de trabalhar com esse ponto. Quando nós sofremos, a nossa mente é parte desse sofrimento.

    Então, do que se trata com o treino da mente é que temos que dar à mente uma direcção para que não se converta em parte desse sofrimento, para que não se converta em parte das circunstâncias. É tão importante, realmente, darmos conta, estamos verdadeiramente convencidos, se a nossa mente necessita de treino ou não. Agora somos vítimas das circunstâncias, somos como um barco sem timoneiro, não temos nenhuma possibilidade de dar uma direcção, não podemos guiar o nosso barco, portanto sofremos. Sofremos porque estamos expostos ao sofrimento do desejo, do apego, da desilusão, do orgulho e do medo.

    Por exemplo, se escolhemos a desilusão, o sofrimento que nos cria a desilusão, primeiro tentamos diminuir esse sofrimento, e logo conseguimos que a desilusão desapareça. Imaginamos, nesse momento, quando já não existe o sofrimento da desilusão em nós, nesse momento já não há sofrimento porque não há desilusão. E o mesmo ocorre com as outras emoções. Se nós sofremos com ciúmes, se os ciúmes desaparecem já não há sofrimento dos ciúmes em nós. Realmente, imaginai, realmente é possível suprimir o sofrimento dos ciúmes sem ter ciúmes? Imaginai como seria uma vida em que todas as pessoas têm o que desejam, todas as pessoas têm o que nós gostaríamos de ter, mas nós não sentimos ciúmes, não sentimos inveja, não sentimos esse sofrimento. Agora, quando vemos que todos têm aquilo que nós também gostaríamos de ter e não temos, podemos tentar mostrar-nos damas e cavalheiros e não ficarmos invejosos, mas é muito difícil. Então, aqui trata-se de dar à nossa mente o treino suficiente para que esta mente não contribua para o seu próprio sofrimento, para que não seja parte dessas circunstâncias, dessas causas e condições que nos fazem sofrer.

    Agora, simplesmente para dar um pouco de recriação vamos usar um exemplo para ilustrar isto. Por exemplo, de uma empresa que nos dá um mau serviço. Por exemplo, podemos pensar que queremos apanhar um avião, comprámos um bilhete de avião, vamos ao aeroporto e ali dizem-nos que não estamos nas listas de embarque. E nós dizemos que sim, que temos o bilhete. E logo eles dizem que não, que não estamos na lista, sem nem sequer olharem a lista. Nós dizemos-lhes: “Por favor, vejam porque estamos na lista.” E eles dizem que não, e nos rejeitam. O que se sente nesse momento? Pois sentimos um incómodo, um aborrecimento, desilusão. Então, podemos pensar que este aborrecimento é necessário, que é um aborrecimento justo pelo modo como nos trataram. Com isto não quero dizer que este aborrecimento (irritação) não seja normal, inclusive nós podemos sentir-nos um pouco excitados com isso, não é? Mas... na verdade desfrutamos dessa emoção? Desfrutamos do aborrecimento, da aceleração do coração, do ritmo cardíaco, de irritar-nos, de nos pormos histéricos? Realmente isto produz-nos desfrute? Então, talvez, não nos damos conta do que aquilo que nos está acontecendo nesse momento é sofrimento, é criar sofrimento. Então, a ideia desse treino da mente é que podemos dispensar esse sofrimento, esse aborrecimento, essa emoção.

    Também podemos imaginar que nos damos conta que o nosso noivo ou a nossa noiva nos quer deixar... imaginai que alguém realmente nos faz muito mal, nos diz o horrível que somos, o feio que somos, o pouco inteligente que somos... tudo isto, e realmente sentimo-nos muito feridos. Nós podemos dispensar isto, se treinarmos a mente podemos evitar isto. Podemos evitar este sentimento de sentir-se “feito pó” ferido por uma circunstância externa.

Com o treino da mente não queremos ser felizes, aquilo que queremos fazer é usar essas situações para de alguma maneira sermos mais dignos, para termos mais animo.  
   
    Aqui estou eu, como um vendedor, como um representante que quer vender alguma coisa. Mas na realidade temos de ser nós mesmos este representante, para realmente convencermo-nos a nós próprios de como é bom e importante o treino da mente para nós mesmos, e o muito sofrimento a que nos podemos poupar. Isto talvez vos possa assustar... assim se não o quereis escutar, tapai os ouvidos: não fazemos o treino da mente para ter êxito na vida. O treino da mente não é necessariamente para nos fazer felizes, porque quando falamos de felicidade temos tantas ideias distintas da felicidade, que é melhor pensar: “vou fazer o treino da mente mas não para ser feliz, não para procurar essa felicidade.”

    Não sei se algum de vós já fez este treino da mente e não sei se vos fez felizes ou não. Mas uma coisa está clara: “o treino da mente está destinado a fazer a nossa mente livre”. Assim se fazeis o treino da mente não vais necessariamente sentir um grande gozo, tudo o que pensamos quanto aos chacras, canais… o treino da mente não vai necessariamente nos fazer ver luzes em todo o lado, nem há auras que vamos ver. Quando fazemos o treino da mente, o simples treino da mente, estamos sentados numa sala de pedra, como esta. Não se transformará em algo dourado, com jóias, com luz, continuará parecendo pedra, mas é igualmente bom como se fosse de ouro, porque estamos livres do desejo do ouro. Assim que, quando penseis que o treino da mente vos vai fazer felizes, não tendes que pensar que tudo o que vais tocar se vai converter em ouro. É por isso que digo que não estamos praticando para ser felizes. Neste momento, eu seria tão feliz se simplesmente pudesse ser livre do sofrimento. E uma vez que tenha obtido a liberdade do sofrimento, então podemos preocupar-nos com a decoração e tudo o mais.

E portanto o treino da mente liberta-nos inclusive da expectativa da felicidade. Em vez da dependência da ideia de felicidade.

    Então, vou ler estes textos... queria falar a respeito do treino da mente, “As 8 estrofes para o treino da mente”. Primeiro vou ler em tibetano. (...) 

    Todos os seres sencientes são-me mais preciosos   
            Que Chintamani, a jóia que realiza todos os desejos:   
          Com o pensamento de realizar o seu bem supremo,    
 Possa eu constantemente conhecer o seu valor. 

    Isto foi escrito por um Mestre que se chamava Langri Thampa. Estou certo que já haveis ouvido falar dele. Talvez penseis: “outra vez o treino da mente, que aborrecido!” Pode haver um momento em que comeceis a pensar... Bom, a estes tibetanos falta-lhes imaginação. Pelo menos uma coisa é clara: estão vendendo a mesma coisa uma e outra vez. Mas somos livres de pensar: “que pelo menos não tentem vender-me a mesma coisa com nomes diferentes.”

    Hoje em dia, vendem-se tantos livros (budismo). Nestes livros há algo de ideias budistas e estão escritos em parte por budistas e também por gente que não o é. E as pessoas podem deixar-se levar ou arrastar por estes livros, e podem pensar: “Que livro tão maravilhoso… que ideias tão novas!” Se realmente as ideias que se expõem nesse livro são budistas, pois nenhum budista pode escrever algo mais novo ou mais interessante que o próprio Buda. Se o fazem, então são melhores que o Buda. Se for este o caso, então os Ensinamentos de Buda poder-se-iam guardar num armário e esta pessoa seria o novo Buda. E é por isto que ainda que o tenhais ouvido muitas e muitas vezes, eu não me sinto incomodado de o repetir uma vez mais. Como disse antes não estou aqui para vos convencer. Apenas sou alguém que tenta treinar a sua mente. Assim, por favor, não tendes que crer que sou um Mestre Budista.

    Neste texto diz: “possa eu ver como um tesouro todos os seres que me são mais preciosos que a Jóia que realiza todos os desejos”. Porquê? Pois, porque os seres são a condição para que eu possa obter a total liberdade. A liberdade das emoções conflituosas. Como podem os seres fazer isto? Talvez haja alguma dúvida no porquê da nossa mente necessitar deste treino. Pode ser que na nossa mente haja uma pequena dúvida sobre se necessita do treino. Num nível intelectual, creio que todos estamos convencidos de que a nossa mente necessita de treino, mas emocionalmente podemos sentir que… sim… talvez a nossa mente necessite um “pouco” de treino.

   Como sabemos, a nossa mente não necessita de nenhum tipo de treino para sentir desilusão, para obcecar-se, para sentir ciúmes, inveja, orgulho. Não há nenhuma ajuda governamental para a irritação, a obsessão, não existem colégios para aprender como ser ciumento, surge-nos simples e naturalmente. Então, quando falamos aqui do treino da mente todos sabemos que não é para desenvolver estas emoções, e que a ideia do treino da mente é reduzir a força dessas emoções em primeiro lugar, e logo, no final, libertamo-nos delas.

    Normalmente, quando fazemos algum tipo de treino necessitamos dum companheiro. Por exemplo, se queremos treinar com uma espada, necessitamos do par com o qual lutar, não é? E para libertar-nos das emoções conflituosas e para aumentar as emoções positivas ou as qualidades, necessitamos do apoio dos outros seres. Os seres são como o nosso companheiro no treino. Desde este ponto de vista, aquilo que nós chamamos seres, não importa que sejam humanos ou animais, estes seres são absolutamente necessários. Vou contar-vos uma história: “No tempo de Buda havia um meditador que praticava muito tempo num lugar muito solitário. E durante muito tempo não surgia o desejo, o desejo carnal nele. Então, disse a si mesmo que estava livre de desejo, de apego. E disse-o a todas as pessoas. Assim quis ir ver o Buda, para dizer-lhe o bom trabalho que tinha feito. E no caminho para ir dizer isto ao Buda, viu muitas raparigas formosas… então deu-se conta do muito que lhe faltava para estar livre do apego. Isto aconteceu-lhe porque não tinha os seres sensíveis perto dele. E talvez também aconteceu porque não fez bem o treino. E é por isto que este verso diz o importante que são os seres. Assim a primeira coisa que há que fazer é mudar a nossa forma de olhar quando vemos as pessoas. Quando vemos as pessoas às vezes gostamos, caem-nos bem, e outras vezes ficamos um pouco irritados. Às vezes gostaríamos que ninguém existisse, que estivéssemos totalmente sós.

    Quando, por exemplo, vais às compras e estais procurando um sítio para estacionar, não tendes o desejo que houvesse um sítio livre para estacionar o vosso carro? Naquele instante em que há esse desejo em vós de que aquele carro não estivesse ali. E aqui entra o treino, quando vês uma rua cheia de carros e não há sítio para vós, então, nesse momento, tendes que mudar a vossa maneira de ver as coisas. Por exemplo: conduzimos pela rua… não há sítio para estacionar, irritamo-nos e dizemos alguma asneira. De que serve isso? A irritação não nos vai retirar os carros dali. Sentimo-nos um pouco mal, preocupamo-nos. E se nesse momento pensarmos: “Que bom que toda esta gente encontrou um sítio para estacionar!” Então, realmente, em vez de nos sentirmos incomodados ou irritados com isto poderíamos sentir uma felicidade interior, uma alegria por esta situação. E inclusive desta maneira, a curto prazo, os outros seres podem ser fonte de felicidade para nós. E a largo prazo, se podemos praticar essa alegria de actuar, então libertamo-nos de todas as causas de todos os ciúmes e do aborrecimento.

    Esta alegria, que está livre de apego, e que está livre dos ciúmes só pode surgir em nós através dos outros seres. Normalmente, nós só nos vemos a nós mesmos. Vivemos num mundo como se o único ser que existisse fosse nós mesmos. Estamos nós, estão os outros, mas realmente temos sempre este olhar só sobre nós mesmos. Então, a ideia do treino da mente aqui, é que há uma população mundial que é mais do que nós, então o treino da mente é também não negar que existem os outros, realmente admitir que há mais do que nós mesmos. E também a alegria que realmente podemos conseguir quando aceitamos as outras pessoas e nos libertamos do medo de que só somos a única pessoa. Este tipo de alegria não se pode comprar, não se pode comprar com nenhuma substância material. Nem sequer se impomos aos outros que nos façam felizes, não podemos conseguir esta alegria. Não a podemos roubar, só surge de apreciarmos os outros seres sensíveis. Apreciá-los pela nossa própria vontade.

    Pois… isto está bem por hoje… obrigado.




(fonte: página aberta do facebook)

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